quarta-feira, 24 de junho de 2015

PROFECIA DO SUL



>>> Imbituba antiga. Rua Irineu Bornhausen, em foto de José Carlos Teixeira

PROFECIA DO SUL

Baby Espíndola 

Brilha no sul a história
tanto ontem quanto agora.
Do carvão vem a riqueza
- status para o patrão,
político de falação -,
resta ao mineiro a pobreza.

Em tempos sombrios,
o homem no subsolo minerava,
e se do salário reclamava,
se clamava por justiça,
apanhava da polícia.

Descontente com a exploração,
mas, mesmo assim, muito esperançoso,
um mineiro profeta,
com a voz do Uirapuru,
aos quatro cantos do sul
cantou a lenda do Cristo.

Dizia:
- Não pode ser explorado
o homem trabalhador.
É preciso igualdade
na repartição do pão.
E no Sul, o pão é o carvão!

Então, de repente...
Numa manhã de esperança,
com nome de sindicato
nasce a organização,
saída da profecia:
sangue-suor-poesia,
salário-pão-energia.

Mas, foi preciso muita luta,
sangue no fundo das minas,
batalhas em campos de Anita,
surpreendente guerreira
da Juliana República.

Sob sol ou sob chuva,
desde Criciúma
(grande cidade)
e toda a região,
corre em trilhos o carvão,
nos trens que sacodem o chão,
até a vizinha Imbituba.

Do Porto Henrique Lage,
navios de muitas bandeiras,
dentre os quais o Jacqueline,
partem levando do Sul,
energia para o Brasil
e para as engrenagens do mundo.

Portuário, bom amigo,
homem vivido e sofrido,
a história escreve teu nome
nos mares de mil navios,
nas terras de muitos montes.

Portuário, creio, não sabes:
Deus trabalha no porto...
Com rosto anônimo
e mãos de sangue,
manobra máquina de trem,
mas é mineiro também.

Um dia – tempos remotos –,
pescou com teus avós,
nas aventuras primeiras,
à caça de muitas baleias,
hoje supostamente protegidas
por uma rede de leis.

Homem do porto,
olha o horizonte!
Ao sol navega tranquilo
outro navio carvoeiro.
Leva na ponta do mastro
a bandeira da esperança,
símbolo de todos os povos.

No estandarte,
o ouro de uma inscrição,
encravada com carvão:
Obrigado, portuário,
universal brasileiro!

[Poema de 1986]


quinta-feira, 18 de junho de 2015

CANÇÃO DA CHUVA


CANÇÃO DA CHUVA

Baby Espíndola

Tarde de inverno...
Lágrimas do céu
caindo preguiçosamente sobre a terra,
lavando as árvores,
os jardins, os gramados, as pedras,
e provocando uma inevitável nostalgia.

Chuva – melodioso e encantador piano –,
executa a mais sublime canção de amor
para a mulher que amo.
Diga a ela, com todas as rimas
da mais melodiosa canção,
que eu sofro de solidão,
que estou sufocando de saudade.

Diga-lhe, bem baixinho, delicadamente,
que eu desejo, intensamente,
envolvê-la num forte, quente e protetor abraço.

Conte a ela, que a vida só tem sentido,
quando vejo o seu sorriso,
nos lábios encantadoramente sensuais.

Se ela sorri,
as flores do campo se abrem
em encantos de primavera,
os pássaros cantam encantados,
e os anjos tocam cornetas,
nas janelas das nuvens.

Chuva, beija delicadamente
o rosto da mulher que eu amo.
Faz ela acreditar,
que os respingos gelados
são gotas das lágrimas
que, há muito, muito tempo,
eu venho chorando em silêncio.

E se ela fechar os olhos úmidos,
permita-lhe sonhar um filme de sonhos.
Faz ela imaginar que estamos juntos,
correndo pelos campos,
abrindo trilhos entre as flores,
trocando demorados beijos,
desenhando o futuro,
cantando cantigas de encantos.

Chuva, do telhado,
pinga suave e ritmado
sobre os cabelos 
da mulher que tanto amo.
Chuva, faz florescer as roseiras
e amadurecer os frutos.
Faz com que a paz
seja permanente companheira,
afastando do rosto dela
até o mais sutil vestígio de agonia.

Chuva, chuva das noites de inverno,
compõe nas nuvens
e derrama sobre a terra,
uma canção de amor,
uma balada dos céus, única e singela.

Melancólica chuva,
faça com que ela me ouça,
pois este é o meu último desabafo,
a última revelação.
Depois disso,
silenciarei para sempre.

Mas, mesmo o meu silêncio
deverá ser entendido,
como uma eterna prova
de um profundo sentimento.

Chuva – chicote do rosto e da alma –,
convoca a orquestra dos anjos
para que executem,
para a mais amada das mulheres,
uma canção de lágrimas...

A canção da chuva.