quarta-feira, 31 de agosto de 2011

MORENA




Baby Espíndola

Amigo, preste atenção,
nesses versos sem sentido,
que há muito, muito tempo,
um adolescente sofrido,
um sonhador meio tímido,
escreveu em desabafo.
São versos muito singelos,
para uma jovem morena,
da cor das noites escuras,
a mais bela do lugar.
De olhos iluminados,
duas brilhantes estrelas,
imitação do luar.


Era um sonhador, o rapaz...
Sonhava, sem ser vulgar,
um repertório de sonhos,
que não tinha jeito de acabar.
Sonhava com as coisas mais puras,
como água límpida,
no rio que desce do morro
e navega para o mar;
borboletas e passarinhos,
elas, em volta das flores,
eles, em torno dos ninhos,
nas chácaras com muitos frutos,
que brotam do fundo da terra
e se espalham a sonhar.


Sempre pensando na morena
cor da noite e olhos de estrelas,
o sonhador adolescente
sonhava
e cantava solitário,
somente palavras de amor,
que nasciam no fundo do peito,
mas que ele, muito sem jeito,
não se atrevia a revelar.


Nas cordas do violão,
na boca do cantador,
brotava um amor verdadeiro,
guardado a sete chaves,
com sacrifício e muita dor.

Nas tardes que plantam as noites
– sob a sombra dos coqueiros,
num mundão de pasto verde,
onde o gado pasta manso –,
o moço muito calado,
ficava meio cismado.
Jurava aos passarinhos,
ao sabiá trovador,
aos amigos canarinhos:
assim que encontrasse a morena,
aquela da voz serena,
confessaria
todo o seu grande amor.


Mas, que nada!
Quando avistava a moça,
ficava muito quieto,
olhando, admirado,
aquela beleza singela,
sem coragem de falar.

* * *

Sem que se pudesse evitar,
a vida passou a galope,
deixando rastros de saudade.
Tantos anos separados,
ela no sul,
ele no norte...
Tanta angústia,
sentimento aprisionado no peito,
solidão,
muita saudade,
até falta de sorte.


E agora,
com os cabelos já brancos,
o moço velho cansado,
volta para casa ferido,
depois de enfrentar, destemido,
tantas batalhas no mundo.
Volta triste e derrotado,
desiludido, magoado.

Quase esquecendo
que o tempo passou,
procura então a morena
– aquela da boca serena
e olhos cor das estrelas,
sob duas tranças da noite...
Aquela que, no passado,
foi o seu grande amor.


Procura sob os coqueiros,
na curva do rio traiçoeiro,
mas não consegue encontrar.


Então, depois de muito indagar,
o homem ouve do vento,
que geme no alto dos montes,
a canção que canta triste,
a história da morena,
que tinha boca serena...

Disse o vento:
– A morena foi embora,
pois, depois de muito, muito tempo,
cansou de esperar.

{Baby Espíndola}

Palhoça, domingo – 17/11/1996.